Saudação do Presidente
Feito o Sinal da Cruz, o presidente da celebração,
abrindo os braços saúda a Assembléia. A saudação, no começo da celebração é
muito antiga. Pelo menos, desde o tempo de Santo Agostinho, já se tem notícia
dela. "Entrei... saudei o povo e as sagradas escrituras foram lidas"
( A Cidade de Deus, 22,8). Ela indica que a convocação da Assembléia é um
gesto de fé e que vai se realizar um acontecimento em que Cristo Jesus
e seu Espírito serão protagonistas.
Como em toda a celebração, também na
saudação inicial, o presidente está agindo "in Persona Christi", ou
seja "em lugar, na Pessoa de Jesus Cristo". Por isso a fórmula deverá
ser sempre: "esteja convosco" e nunca "conosco". Talvez
este pensamento fique mais claro, se considerarmos a narração da Ceia. Também
lá, o presidente diz: "Isto é o meu corpo" e não: "Isto é o
corpo de Cristo". Quem age e fala, através do sacerdote, é o próprio
Cristo. Daí, o "isto é meu corpo".
O Missal Romano apresenta três
fórmulas de saudação para o sacerdote e uma específica para o bispo. A edição
brasileira acrescenta, além das previstas pela edição latina, mais quatro.
Os outros livros litúrgicos dão grande margem de
flexibilidade à fórmula da saudação inicial.
O Ritual de Iniciação Cristã de Adultos diz que "o presidente
saúda cordialmente os candidatos. Dirigindo-se a eles e a todos os presentes,
expressa a alegria e a ação de graças da Igreja..." (RICA 74 e 246). O Ritual do Batismo de Crianças diz
simplesmente que "após o canto inicial, quem preside saúda a
assembléia".(RBC 34) O Ritual da
Penitência orienta para que o sacerdote receba com benevolência o penitente
e o saúde amavelmente (RP 41). O Ritual
da Unção dos Enfermos e sua Assistência Pastoral expressa-se na mesma linha
dos demais rituais com estas palavras: "O sacerdote... aproxima-se e saúda
cordialmente o enfermo e todos os presentes"
Inspirados nestas orientações dos
rituais, podemos dizer que, também na missa, embora as fórmulas previstas sejam
todas muito ricas, o presidente pode ter a liberdade de saudar cordialmente os
fiéis, com palavras próprias, contanto que mantenha o sentido desta saudação,
muito bem lembrado pela IGMR 50: "O sacerdote... pela saudação, expressa à
comunidade reunida a presença do Senhor. Esta saudação e a resposta do povo
exprimem o mistério da Igreja reunida".
Rito Penitencial
Embora o Papa Paulo VI tenha dito que o rito penitencial
ou a reconciliação com Deus e com os irmãos no início da missa tenha sido
restaurado, segundo a primitiva norma dos Santos Padres (Missal Romano p. 19),
na verdade o ato penitencial nasceu na Idade Média, entre os séculos IX e XI,
e, nem sempre fazia parte dos ritos introdutórios. Às vezes era rezado depois
da homilia e, outras vezes, antes da comunhão.
No
século XII, em Roma, depois da pregação, os fiéis manifestavam seu desejo de
perdão. Eram, então, absolvidos pelo presidente da celebração.
No
século XIII, tendo-se recuperado o hábito da comunhão freqüente, alguns
pastores acharam conveniente inserir na celebração, como preparação à comunhão,
o rito de absolvição previsto para a comunhão dos doentes fora da celebração
eucarística.
Com
a promulgação do Missal de Pio V, em 1570, determinou-se que o ato penitencial
fizesse parte dos ritos iniciais da missa e que fosse uma oração pessoal do
presidente da celebração, como aliás, tinha sido nos seus inícios, ou seja, a
partir do século IX
Por
mais que seja importante, o ato penitencial não é absolutamente necessário na
estrutura da missa. Pode ser omitido ou substituído por outros ritos, como por exemplo, no Domingo de Ramos, na
Quarta Feira de Cinzas, nas ocasiões em que se une as horas do Ofício com a
Missa.
Existem
quatro modelos de atos penitenciais no missal. O primeiro é a recitação
comunitária do Confiteor (Confesso a Deus todo poderoso). O segundo é um breve
diálogo: Tende compaixão de nós Senhor. Porque somos pecadores... O terceiro é uma série de aclamações a Cristo, o
Senhor, com a resposta: Senhor tende piedade de nós. O quarto é a bênção e
aspersão da água sobre o povo.
Segundo
o Missal Romano, a bênção e a aspersão da água não é ato penitencial, mas seu
substituto (Missal Romano p. 1001). No entanto, na opinião de muitos
liturgistas, "constitui, sem dúvida, um dos mais belos e mais autênticos
atos penitenciais. Ela, é ao mesmo tempo, uma recordação do batismo e um ato
penitencial, uma ablução e uma purificação, um reconforto e um ato de
salvação... Infelizmente o texto e o cântico só se encontram num apêndice do
Missal" (Theodor Schnitzler, Missa, mensagem e vida, p. 91).
A
dinâmica do ato penitencial é a seguinte: o presidente ou outro ministro faz
uma monição, convidando à atitude de humildade e confiança. Segue-se um momento
de silêncio, a realização de um dos quatro modelos, descritos acima e encera-se
com a oração de conclusão que é uma absolvição em forma de pedido.
Muita gente pergunta se a
absolvição, recebida no rito penitencial, no início da missa, tem valor
sacramental. Noutras palavras, se o rito penitencial pode substituir o
sacramento da Reconciliação (a confissão).
Antes de responder esta pergunta
seria interessante dar uma olhada no que ensina a Igreja sobre a relação entre
Eucaristia e perdão dos pecados. A este respeito distinguem-se duas tradições.
Uma baseia-se em Mateus 26,28 e afirma o poder remissório da Eucaristia.
Aparece mais nas orações litúrgicas e em alguns dos primeiros escritores da
Igreja. Apresentemos apenas dois exemplos.
"Nós vos oferecemos, ó Deus, este sacrifício de paz e de louvor para que
perdoeis a nossas faltas..." (Oração sobre as oferendas - Missa pelo
perdão dos pecados).
"Ó Deus de misericórdia, que por este sacramento nos destes o perdão,
concedei-nos a graça de evitar doravante o pecado...."( Oração de
pós-comunhão - Missa pelo perdão dos pecados)
A outra tem como raiz bíblica a orientação do Apóstolo
Paulo aos Coríntios (1Co 11,28), pedindo que se faça um exame antes de comer o
pão e beber o cálice, pois quem come e bebe o Corpo do Senhor indignamente,
come e bebe a própria condenação. Esta tradição aparece em muitos escritores
antigos e também nas orientações práticas da Igreja. Foi levada tanto a sério
que, com o tempo, os cristãos já não mais recebiam o Corpo do Senhor. Tal
situação exigiu, da parte da Igreja, orientações que obrigassem a comunhão, ao
menos uma vez por ano.
A título de exemplo apresentemos também duas citações.
"Os que
comungam indignamente o corpo do Senhor são como os que O crucificaram"
(S. João Crisóstomo).
"Não seria
absurdo afirmar que aquele que come indignamente o pão do Senhor ou bebe
indignamente o seu cálice, à semelhança de Judas, come e bebe para o seu juízo"
(Orígenes).
A reflexão teológica atual reconhece
que a missa, enquanto renovação do sacrifício do Calvário, tem poder de perdoar
os pecados, inclusive os graves, como afirma o Concílio de Trento. A
Eucaristia, no entanto, não se sobrepõe, muito menos invalida o sacramento da
Reconciliação. Os dois sacramentos, cada qual a seu modo, celebram o perdão.
Conclui-se daí que o rito penitencial, enquanto parte da missa, é expressão de
perdão, próprio da Eucaristia. Não pode, por isso, substituir o sacramento da
Reconciliação (a confissão).
No próximo número refletiremos sobre
o Glória.
Glória
Os cristãos dos primeiros séculos,
inspirados nos salmos e outros hinos da Bíblia, compuseram uma quantidade muito
grande de cantos religiosos, hoje, quase todos perdidos. Dentre os que sobraram
encontra-se o Glória, ou grande Doxologia (em oposição à pequena doxologia: Glória
ao Pai...), que cantamos nas missas de domingos, menos os do Advento e da
Quaresma, bem como nas solenidades e festas e ainda em celebrações especiais
mais solenes (IGMR 53).
A Instrução Geral do Missal Romano
(IGMR) faz questão de dizer que "o Glória é um hino antiquíssimo e
venerável". Alguns autores acham que ele foi composto no século II. São
Policarpo que, segundo o testemunho de Tertuliano, foi ordenado bispo pelas
mãos do Apóstolo São João, na hora de seu martírio, inspirado no Glória, teria
feito a seguinte oração: "Senhor,
Deus todo-poderoso, Pai de teu Filho amado e bendito, Jesus Cristo, pelo qual
recebemos o conhecimento do teu nome, Deus dos anjos, dos poderes, de toda a
criação e de toda a geração dos justos que vivem na tua presença! Eu te bendigo
por me teres julgado digno deste dia e desta hora [...] Por isso e por todas as
outras coisas, eu te louvo, te bendigo, te glorifico, pelo eterno e celestial
sacerdote Jesus Cristo, teu Filho amado, pelo qual seja dada glória a ti, com
ele e o Espírito, agora e pelos séculos futuros. Amém".
O Glória é tão antigo que, para
alguns autores, seu início não depende de Lc 2,14. Muito pelo contrário, foi
Lucas quem se inspirou neste popular hino dos primeiros cristãos.
No início, o Glória não era cantado
nas missas, nem no Ocidente, nem no Oriente. Era um canto de ação de graças
reservado para a oração da manhã nos dias de festas e ocasiões solenes. Por
volta do século V passou a ser cantado nas missas de Natal, celebradas pelo
Papa, justamente porque iniciava com as palavras que os anjos cantaram por
ocasião do nascimento de Cristo. No século VI, o Papa Símaco ampliou seu uso
para todos os domingos e para as festas dos mártires, mas somente nas missas
presididas pelo bispo. Já no século VII, também os presbíteros o cantavam no
dia da Páscoa. A partir do século XI passou a fazer parte normal da celebração
eucarística, exceto nos dias e tempos penitenciais. Hoje, como já foi dito,
está reservado às missas dos domingo, exceto no tempo do Advento e da Quaresma,
das solenidades e festas e, ainda, das celebrações especiais mais solenes.
O Glória é um hino. Ser cantado faz
parte da essência de qualquer hino. Ou se canta ou não é hino. Por isso, embora
o Missal Romano permita a sua recitação, esta possibilidade deveria ser
raríssima exceção.
O glória faz parte dos ritos de
abertura, com exceção da Vigília Pascal. Nesta celebração ele se encontra no
meio da liturgia da Palavra, precisamente para marcar a passagem das leituras
do AT para as do NT. As rubricas pedem
que neste dia o glória seja acompanhado do toque dos sinos e sinetas e com
entrada de flores. A mesma solenidade se pede para o glória da missa vespertina
da Quinta-feira Santa.
O glória termina com um louvor a
Trindade, mas sua estrutura não é trinitária. É uma glorificação ao Pai e uma
súplica ao Filho. Pertence à categoria de cantos que constituem ritos por si
mesmos e são atos independentes (IGMR 37), diferentes de outros que acompanham
um rito, como por exemplo, o canto de entrada, das oferendas, da fração do pão
(o Cordeiro de Deus) e da comunhão. O glória, por isso, deve ser cantado
por inteiro. Cantar apenas uma estrofe
seria truncar o rito pela metade.
Existem várias maneiras de cantar o
glória. "Entoado pelo sacerdote ou, se for o caso, pelo cantor ou grupo de
cantores, é cantado por toda a assembléia, ou pelo povo que o alterna com o
grupo de cantores ou pelo próprio grupo de cantores" (IGMR 53). A última possibilidade
deve ser considerada uma exceção. "Mesmo que excepcionalmente o coral
cante sozinho o Glória, que o povo não se sinta marginalizado ou estranho
expectador, devido à música estranha e esquisita" (Estudos da CNBB 12, p.
36).
O Diretório para Missas com Crianças
permite que, às vezes, para que se torne mais acessível aos pequenos, se
"adote composições musicais apropriadas com versões populares aceitas pela
autoridade competente, ainda que literalmente não estejam de acordo com o texto
litúrgico" (DMC 31). A mesma permissão se encontra no Missal alemão, para
as missas com o povo em
geral. No entanto, esta orientação, de caráter pedagógico,
não deverá, de jeito nenhum, ser considerada luz verde para "substituí-lo
por qualquer hino de louvor ou por paráfrases que se distanciam demasiadamente
de seu sentido original" (Estudos da CNBB 79, p.133). Um texto tão
venerável, cantado por cristãos há mais de dezoito séculos, não pode ser
simplesmente descartado. Além do mais, o glória possui uma dimensão ecumênica.
É conhecido e aceito pela grande maioria das Igrejas cristãs. Ao cantá-lo, não
estamos expressando apenas nossa fé pessoal ou a fé de nossa denominação
eclesial, mas a de todos os cristãos, de todos os tempos e de todos os lugares.
O glória, portanto, é patrimônio da família cristã, um texto que faz parte de
nossa identidade coletiva.
Oração do
Dia
Encerram-se os Ritos
Iniciais da missa com a "Oração do Dia", também chamada "Coleta" (IGMR 54). A expressão
"coleta", nasceu na liturgia galicana. Mais tarde, passou a ser usada
pela liturgia romana. Vem do tempo em que os cristãos iniciavam a celebração da
Eucaristia numa igreja e a continuavam em outra. A primeira chamava-se "igreja da
reunião", em latim, "ecclesia collecta". Antes de sair em
procissão para a segunda igreja, o que presidia a celebração fazia "a
coleta" ou seja, oração da "comunidade reunida".
Hoje, prefere-se a expressão "Oração do
Dia", pois, conforme a orientação do Missal, esta oração "exprime a índole da celebração"
daquele dia (IGMR 54). Esta, portanto, não é a hora de colocar as intenções
pessoais. Não é coleta de intenções, mas momento de os fiéis, a convite (oremos)
do que preside, se "conectarem", se "reunirem" ao redor do
que está sendo celebrado na festa do dia. Para que tal aconteça solicita-se um
breve silêncio depois do convite: oremos. Tomemos como exemplo a bela oração da
Noite de Natal: Oremos. (silencio). "Ó Deus, que fizestes resplandecer
esta noite santa com a claridade da verdadeira luz, concedei que, tendo
vislumbrado na terra este mistério, possamos gozar no céu sua plenitude. Por
nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, na unidade do Espírito Santo".
Amém.
Como se pode ver, a oração se compõe de quatro
elementos. O terceiro elemento, por sua vez, compõe-se de outros três.
1) O convite à oração: é uma herança do judaísmo. Os grandes momentos de oração comum da
assembléia litúrgica eram precedidos de um convite. Este convite é mais que um
sinal. É um apelo que contém em si o que vai acontecer. Realiza o que diz, ou
seja, coloca em oração.
2) O silêncio:
Não é um detalhe facultativo. Está precrito na IGMR 54. Tem duas funções.
Permite aos fiéis tomarem consciência de que estão na presença de Deus e dá
tempo para que cada um exprima para si mesmo o sentido da festa que se está
celebrando.
3) O corpo da oração: Divide-se em três elementos. a) A invocação,-
Ó Deus - quase sempre acompanhada de um considerando (que fizestes
resplandecer..., que reacendeis em nós...). Na liturgia romana a oração é
sempre dirigida ao Pai. Também nas festas dos santos. Esta prescrição feita
pelo Concílio de Hipona (393) se manteve em vigor até o século X, quando a
liturgia galicana se impôs em
Roma. A partir desta época, começam a ser encontradas orações
dirigidas a Cristo b) O pedido,
motivo fundamental da súplica. Flui do conteúdo da festa, ou do tempo
litúrgico. c) A conclusão mostra que
a oração é feita por Cristo no Espírito Santo.
4) O Amém: Com
o amém, o povo se associa à súplica e se apropria da oração (IGMR 54). É como
se dissesse ao que preside: o que acabas de dizer a Deus, como nosso
intercessor e representante, é também nossa prece.